(Parte 3)
Buscando ilustrar, valho-me da Mitologia grega, tal como cantada no Século VII a. C. pelo poeta grego Hesíodo em Teogonia.
As
Hórai, filhas de Zeus e Themis (a “Justiça
Divina”), estipulavam padrões para os ciclos da natureza e as ações humanas no
decurso da existência, enquanto as Moirai
(do grego moîra, “parte destinada
a cada um”), também filhas destes mesmos deuses, estabeleciam o que a cada ente
seria dado viver, segundo a medida individual pela qual todo existente,
aventurado ou desventurado, encontraria sua razão de existir ao se integrar na
ordem desejada por Zeus no tempo
certo de cada um, ou kairós (do grego
“oportunidade”), diferenciado de kronos,
(do grego “tempo”), a dimensão temporal sequencial e linear vivida no
cronômetro, com o que, se kronos é
tempo quantitativo, kairós é
qualitativo.
Para
tanto, as Moirai faziam sentir sua
ação em obediência às características individuais específicas (do grego ananké, “necessidade”), no kairós de cada qual (determinado pelas Hórai) e por meio de seus decretos (heimarmene) sempre justos (por Themis) e poderosos (por Zeus).
A partir destas noções, mesmo sendo apenas
mitológicas, propus em Por uma Filosofia da Astrologia: da vida humana, determinada por herança genética e
epigenética, por dinamismos psíquicos inconscientes (alguns dos quais,
inacessíveis) e por efeitos ressonantes e recursivos de campos psicoides e
campos mórficos (...), podemos dizer que o indivíduo avança de evento em
evento, interno e ou externo, num plano variável entre destinação e algum arbítrio
– mas, entre ambos, destinação e arbítrio, a determinação das Moirai tem
supremacia, porque atende a ananké. O que a Astrologia Arquetípica propicia
conhecer é a ananké pessoal, que decorre da causação havida (a determinada e a
condicionada), e como os heimarmene vão em cada kairós ocorrendo, já que com
isso a necessidade (também do latim necessitas, ‘inevitável, inelutável’) se
cumpre, fiel ao que foi estabelecido na causação do indivíduo, seja por efeito
de campo mórfico, por tessitura arquetípica, por herança genética e epigenética
somato-psíquica e ou por condicionamento. Traduzindo-me: surgido, o conjunto de
características peculiares do fenômeno (as destinadas e as condicionadas,
atuais e ou potenciais) requer que determinados eventos, e não outros, ocorram
em sua existência, sem os quais ele, o fenômeno, não será a mais plena
expressão de si próprio. Por isso, tais ocorrências são sua necessidade, e o
que a Carta astrológica natal expõe é quais ocorrências são estas (em qualidade
ou natureza) e quando se darão, isto é, o destino.
Falando
dos símbolos astrológicos, o psiquiatra e psicólogo suíço Carl G. Jung registrou
que não são as posições aparentes dos astros que atuam, mas os tempos que
são medidos e determinados por posições arbitrariamente designadas dos astros.
O tempo apresenta-se [no espaço], então, como uma corrente de
acontecimentos cheia de qualidades.
De
outro lado, o astrólogo franco-americano Dane Rudhyar declarou que os
eventos não acontecem a nós, nós acontecemos a eles.
Talvez
pelas mesmas razões o filósofo neoplatônico Plotino afirmou no Século III que o
movimento dos astros assinala os eventos futuros em cada caso, mas ele mesmo [o
movimento dos astros] não causa todos os eventos, como se acredita. Tudo,
pois, está cheio de sinais, e sábio é aquele que aprende uma coisa de outra.
Jung
conceituou quase ao final de sua vida que os arquétipos têm vida própria que
se estende pelos séculos e dá aos éons sua marca específica, em formulação
análoga ao que Sheldrake, referindo-se a campos mórficos, viria a teorizar mais
de 20 anos depois.
Com
isso, Jung lançava uma importante base para o entendimento da perenidade significativa
dos símbolos astrológicos na detecção dos fenômenos a que os arquétipos se
associam (e, talvez, atuem como causas formais
e eficientes, sempre consoantes à causa final e agindo sobre a causa material), razão pela qual a
descrição fenomênica de há séculos, possibilitada pela Astrologia, não difere
tanto da contemporânea no que há de essencial.
Sheldrake
foi na esteira: ao considerar a hipótese
de ressonância mórfica da memória, poderíamos perguntar: se nos sintonizamos
com as nossas próprias memórias, então porque não nos sintonizamos também com
as de outras pessoas? Eu penso que nós nos sintonizamos (por intermédio dos
campos mórficos) e que toda a base da abordagem que eu estou sugerindo é que
existe uma memória coletiva à qual nós todos estamos sintonizados [LC: memória
impessoal, devo salientar] e que compõe
uma base contra a qual a nossa própria experiência se desenvolve, e em relação
à qual as nossas próprias memórias individuais se desenvolvem. Esse conceito é
muito semelhante à noção de inconsciente coletivo.
Como
ele explica em A new science of life –
the hypothesis of formative causation,
o campo mórfico tem um papel causal no
desenvolvimento e na manutenção das formas de sistemas de todos os níveis de
complexidade. Esta atividade formativa dos campos mórficos é chamada causação
formativa, frente à necessidade de distingui-la do tipo de causação energética,
a qual é minuciosamente estudada pelos físicos, químicos e biólogos. Nesta
hipótese, os campos mórficos só fazem sentir os seus efeitos em conjunção com
os processos energéticos, mas não são energéticos em si mesmos.
Eu pergunto,
restringindo-me aqui a fatos psíquicos (isto é, sem aludir a objetos e ou
eventos): será que os campos mórficos igualmente codeterminariam padrões
mentais genéricos de base arquetípica, os quais comporiam, em arranjos
peculiares sempre conformes a kairós,
os alicerces de cada particular individualidade existente e o conjunto de
eventos que, em sincronicidade, ocorrerão na existência de cada uma, sendo
assim a sua destinação?
Se sim, vou além: será que é ao resultado desta cocausação
que a Astrologia Arquetípica simbolicamente se refere? Penso
que sim, para ambas as questões.
Em
Astrologia Arquetípica e comportamento,de Ptolomeu a Jung na teia do mundo cunhei a expressão “teia do mundo” para
delinear conceitualmente o que quem sabe seja uma rede, ou
teia, ou tessitura dinâmica de fatores imateriais de cocausação não residentes no
espaço-tempo, atuantes no es-paço e no tempo em todo local e momento (mas
variáveis, conforme o local e o momento) e identificáveis pelos símbolos das diferentes
Astrologias, em sua multiplicidade de técnicas.
Olhando por instantes
para fora da Astrologia, tal possibilidade talvez explique também a
ocorrência de cognição sobre o futuro ou outros locais, por meio da identificação de
fatores predisponentes estabelecidos fora do tempo e do espaço na causação de uma corrente de acontecimentos cheia de qualidades (Jung) no espaço-tempo, por efeito
de campos mórficos, arquetípicos ou a ordem implicada, dê-se esta cognição por
percepção paranormal ou com o concurso de sistemas simbólicos de suporte como
os do Tarô, do I Ching ou da Kabbalah, para mencionar aqui apenas algumas técnicas
(ou artes) de cognição mais conhecidas no Ocidente.
No
caso específico da Astrologia, se for assim, igualmente então se entende por
que uma Revolução solar oferece prognósticos que variam segundo o exato local (e
momento) em que se vier a estar em um exato kairós
no continuum tempo-espaço.
Tais fatores, entretanto,
ao contrário da noção platônica de “ideias” inteligíveis influindo como matrizes
eternas da existência sensível, teriam se originado a partir dos fatos da
existência temporal e material, muitos deles aleatórios, passando
a influir, após constituídos e atuando de fora do espaço-tempo, sobre a
existência sensível que decorre no tempo e no espaço.
Existência
que, enquanto se manifesta, por sua vez atua recursivamente sobre estes fatores
imateriais e não temporais, com o passar do tempo e do espaço os altera em
medida variável fora do espaço e do tempo e, assim fazendo, cocausa desde agora
o que ocorrerá à frente no espaço-tempo.
Feito
pegadas do já existido, mas guiando e codeterminando os passos e o rumo da
existência que virá a ser.
Sheldrake informou: nos estágios iniciais de sua existência o
campo mórfico é relativamente pouco definido e [por isso] é influenciado significativamente pelas
variantes individuais [ou seja, pelas variações dos sistemas afins àquele
específico campo, que vão surgindo]. À
medida que o tempo avança, a influência cumulativa de inumeráveis sistemas
análogos vai conferindo uma estabilidade cada vez maior ao campo; assim, quão
mais próximo da média for o sistema, maior a probabilidade de que ele se repita
no futuro
[cocausando eventos similares, seja molécula, substância, tecido, órgão ou
organismo].
E, creio eu, também, padrão
básico de comportamento.
Jung
ensinou, em sentido equivalente ao sugerido por Sheldrake no tocante à
recursividade dos campos mórficos, que aquilo
que acontece na consciência humana tem um efeito retroativo sobre o arquétipo
inconsciente.
Mais ainda: o arquétipo é universal, isto é, sempre e em
toda parte é idêntico a si mesmo. Se for tratado corretamente, nem que seja num
lugar apenas, ele é influenciado como um todo, isto é, simultaneamente e em
toda parte.
A tudo isto os
símbolos das diferentes Astrologias parecem apontar, cada qual em sua própria sintaxe,
razão pela qual apenas um estudo que diligentemente integre diferentes
disciplinas permitirá avançar no entendimento das razões de efetividade das
Astrologias.
E para isto terei de
mencionar o Pensamento da Complexidade.
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